Metodologias ativas em educação a distância

possibilidades de aplicação para promover engajamento dos alunos e aprendizagem significativa

O mundo está mudando rápida e constantemente, com reflexos concretos tanto no que se deve ensinar/aprender quanto em como fazê-lo. O acesso à informação está na palma da mão, quase que em todos os lugares. Diante desse cenário, agora nos perguntamos o que fazer com tantos dados, como podemos pesquisar e selecionar fontes confiáveis, e também como aplicar essas informações na vida real de forma a construir soluções para os problemas encontrados.

Tony Bates (2017), autor do livro “Educar na Era Digital”, defende a necessidade de métodos de ensino que capacitem os alunos a gerenciar informações ou conhecimentos em substituição a métodos que meramente transmitam informações. Ele enfatiza que a aprendizagem experiencial, ou seja, “aprender fazendo”, quando adequadamente planejada, é altamente engajadora e leva o aluno a ter uma aprendizagem mais efetiva a longo prazo. Além disso, ela pode levar a um conhecimento mais profundo e desenvolver competências indispensáveis para a era digital, como, por exemplo, o pensamento crítico e melhores habilidades de comunicação.

Segundo a andragogia, que trata dos princípios para educação de adultos, é preciso considerar que a experiência é uma fonte rica para a aprendizagem de adultos, que seriam motivados a aprender conforme vivenciam necessidades e interesses. Nesse sentido, é um desafio para a educação a distância incorporar o fator da experiência às situações de aprendizagem, apesar de muitos pontos positivos já apresentados em relação à flexibilidade demandada por alunos que trabalham.

É preciso então que exista uma situação de ensino potencialmente significativa, planejada pelo professor, que leve em conta o contexto no qual o estudante está inserido e o uso social do objeto a ser estudado. Ao mesmo tempo, é necessária uma predisposição para aprender, ou seja, o aluno deve possuir uma disposição favorável para apreender o novo conhecimento. Em outras palavras, há uma corresponsabilidade no processo de aprendizagem, na qual se coadunam o planejamento do professor e a disposição do aluno para a aprendizagem.

É neste ponto que o desafio no modelo de educação a distância parece bem maior. A ausência sentida do ingrediente das relações sociais e das exigências características da sala de aula presencial pode contribuir para um alto índice de evasão em EaD, especialmente em cursos sem tutoria.

Por isso, têm sido desenvolvidas ferramentas tecnológicas que dão suporte ao uso de metodologias ativas no ambiente digital, de forma a fortalecer o papel do estudante como protagonista de sua aprendizagem e o engajamento com o curso por meio da possibilidade de realização de atividades que deem um significado pessoal para aquilo que ele está aprendendo.

Metodologias ativas

Nesse contexto, percebe-se a relevância do uso de metodologias ativas em educação, definidas por Filatro e Cavalcanti (2018) como estratégias que envolvem e engajam os alunos no desenvolvimento de projetos e/ou atividades práticas, de modo que eles sejam considerados sujeitos ativos de seu processo de aprendizagem (mediado ou não por tecnologias), deixando de lado o papel passivo e de meros receptores de informações.

A aprendizagem mais profunda requer espaços de prática frequentes (aprender fazendo) e ambientes ricos em oportunidades, conforme ressalta Moran (2018). Por isso, é importante o estímulo diversificado por meio de diferentes abordagens e formatos e a valorização dos conhecimentos prévios dos estudantes para “ancorar” os novos conhecimentos.

De acordo com Filatro e Cavalcanti (2018), são três os princípios básicos para a aplicação de metodologias ativas na educação presencial, a distância e corporativa: protagonismo do aluno, produção colaborativa de conhecimentos e ação-reflexão (Figura 1).

As autoras defendem que o protagonismo do aluno se expressa na centralidade no ser humano e nos sistemas de atividade vinculados à prática educativa, ou seja, o foco da atividade está no aluno e em seu potencial de produção ativa.

Por sua vez, a produção colaborativa de conhecimento se reflete no enfoque tanto no processo quanto no produto da aprendizagem, realizados de forma colaborativa entre os estudantes (por exemplo, trabalhos em grupo, Fóruns de Discussão e Comunidades de Prática).

Já o princípio da ação-reflexão diz respeito à articulação interdisciplinar entre teoria e prática pela interação do aprendiz com o mundo (pessoas, conteúdos e ferramentas).


Resumidamente, ao se pensar em metodologias ativas, deve-se colocar o foco nos alunos e no potencial de construção colaborativa de conhecimento sobre o mundo real no contexto em que eles vivem.


Figura 1

Fonte: Faria, J. B. (2021).

Figura 1: Princípios básicos para a aplicação de metodologias ativas na educação, segundo Filatro e Cavalcanti (2018).

Na prática

A aplicação de metodologias ativas em uma ação educacional não se limita a atividades para pontuação em notas, uma vez que o foco está no papel do aluno no contexto da aprendizagem, o que influencia diretamente no desenho instrucional do curso como um todo.

O desenho, ou design instrucional, envolve “o planejamento, o desenvolvimento e a utilização de métodos, técnicas, atividades, materiais, eventos e produtos educacionais em situações didáticas específicas, a fim de facilitar a aprendizagem humana a partir dos princípios de aprendizagem e instrução conhecidos” (Filatro, 2004, p. 65).

Além disso, as metodologias ativas têm consonância para um olhar a diferentes perfis de aprendizagem, em que cada um pode ter mais identificação e facilidade de aprender por meio de formatos e recursos distintos, como, por exemplo, vídeo, áudio ou representação gráfica.

Com base em análise da literatura atual sobre metodologias ativas que têm sido utilizadas em educação a distância, as principais metodologias citadas estão descritas a seguir:

Tabela 1: Descrição resumida das principais metodologias ativas aplicadas em educação a distância.

Aprendizagem baseada em problemas

Utiliza situações-problema como ponto de partida para a construção de novos conhecimentos (pensar em soluções).

Aprendizagem baseada em projetos

Tem como objetivo final a entrega de um produto, como relatório, plano de ação, protótipo de solução etc.

Aprendizagem baseada em times

Metodologia que cria oportunidades de se obterem os benefícios do trabalho em equipe, por meio da utilização de pequenos grupos de aprendizagem.

Aprendizagem por pares

O professor apresenta um conceito, em seguida monta grupos de alunos para discussão do tema e resposta a questões. Possibilita que alunos aprendam uns com os outros, exercendo papel de professores.

Sala de aula invertida

O aluno estuda a teoria previamente e a sala de aula vira o local de aprendizagem ativa, com perguntas, discussões e atividades práticas.

Aprendizagem baseada em Realidade Aumentada e Simulações

Ambientes virtuais imersivos utilizam os sentidos do corpo para simular situações que poderiam ser vividas na realidade. É fundamental ao final refletir e sistematizar o que foi aprendido.

Gamificação/games/jogos

Utiliza elementos de jogos, como desafios, fases/etapas, competição, colaboração, dificuldades, recompensas e estratégia. Para a geração acostumada com jogos, pode ser muito motivador.

Método de casos

Alunos discutem e apresentam soluções para casos propostos pelos professores. Precisam se posicionar em relação a situações muito próximas da realidade, utilizando fundamentação teórica, debatendo entre si e construindo colaborativamente soluções para o caso apresentado.

Movimento maker

Está ancorado no aprender fazendo: fabricar um objeto com as próprias mãos. O foco está na fabricação de um produto para resolver problemas concretos.

Alunos como designers

Cabe ao aluno o papel de desenhar a própria aprendizagem, ser designer de seu itinerário formativo.

Design thinking aplicado à educação

Processo cujas etapas preveem escuta, observação, investigação, projeção de soluções, prototipagem e implementação de soluções.


Fonte: Faria, J. B. (2021)

Para saber mais:

- Metodologia ativa para tornar o aluno agente no processo de aprendizagem em curso da Universidade de Brasília: meu objetivo era despertar paixão no estudante - diz professor premiado da UnB

- Aprendizagem por pares (excelente exemplo de aplicação e fundamentação das metodologias ativas): Peer Instruction - Metodologia Ativa no Processo de Ensino-Aprendizagem - PUCPR - YouTube

- Design Thinking para Educadores: DT para Educadores - EducaDigital

- Cenários para a Educação no Século 21:
https://ead.stj.jus.br/pluginfile.php/5764/mod_resource/content/8/index.html

Exemplos de aplicação em EaD

No que se refere à aplicação de metodologias ativas em educação a distância, percebe-se que há um conjunto de atividades que podem ser utilizadas para promover engajamento e aprendizagem significativa, conforme descrito na Tabela 1, as quais têm sido amplamente utilizadas inclusive em ações presenciais há muitos anos. Contudo, ao planejarmos um curso a distância sem tutoria (autoinstrucional), o desafio torna-se maior.

Assim, com o objetivo de propor atividades adequadas ao modelo autoinstrucional e com base em metodologias ativas, Faria (2021) desenvolveu pesquisa de conclusão de curso de Especialização em Inovação e Tecnologias na Educação apresentada à Escola Nacional de Administração Pública – ENAP.

Por meio da metodologia de Design Thinking, foi elaborado um conjunto de possibilidades de atividades que podem ser aplicadas a cursos sem tutoria, mas também aplicáveis a ações educacionais a distância em geral, sejam elas com tutoria, híbridas ou totalmente remotas, conforme segue:

Características desejáveis do desenho instrucional de curso EaD baseado em metodologias ativas:

  • Autonomia e Flexibilidade: aluno pode escolher a ordem em que estudará o conteúdo e escolher entre tipos diferentes de atividades (formatos);
  • Reflexão: começar com reflexões que tragam a atenção do aluno para realidade antes de iniciar o estudo da teoria;
  • Foco no cotidiano do aluno: as atividades devem trazer desafios ou situações contextualizadas na realidade do aluno, do seu dia a dia;
  • Ênfase na conectividade: construção de redes, links com o que já existe fora do curso; comunidades de troca;
  • Atividades podem valer pontos ou não;
  • Ludicidade: inserir elementos de gamificação para incentivar os alunos a se engajarem no curso, bem como a realizarem as atividades; e
  • Tipo/formato de produto das atividades (como o aluno pode entregar sua produção): desejável oferecer variadas possibilidades, por exemplo, vídeo, áudio, texto, mapa mental, infográfico.

Figura 2

Fonte: Faria, J. B. (2021)

Figura 2: Características do desenho instrucional baseado em metodologias ativas.

Sugestões de atividades baseadas em metodologias ativas que podem ser utilizadas em educação a distância, inclusive em cursos sem tutoria:

Ênfase na conectividade e na construção de redes.
O aluno será convidado a pesquisar na web exemplos de boas práticas pelo mundo relacionadas ao tema. Cada um contribui com quantas postagens quiser, todos ganham com a construção coletiva de Banco de Boas Práticas. Ao final dos demais módulos do curso, será estimulado a continuar fomentando o conteúdo e consultando as postagens dos colegas.

Foco no cotidiano e na construção coletiva do conhecimento.
Sugestão:

  • Refletir sobre o tema e depois compartilhar com os colegas de curso por meio do Fórum. Cada um pode utilizar o formato que preferir para comunicar suas reflexões: vídeo ou áudio gravado por você, texto, mapa mental, slides etc.

Respeito ao perfil de aprendizagem.
Sugestão: Elaborar e enviar um arquivo, escolhendo o formato que preferir, como vídeo, texto, mapa mental, infográfico ou música.

Ênfase na conectividade, na construção de redes e coletiva do conhecimento.
Curadoria na WEB e compartilhamento do que já existe no mundo. Sugestão: pesquisar e compartilhar por meio de um mural digital, vídeos, artigos ou palestras sobre um tema.

Foco no cotidiano e na ação, escolha do aluno e respeito ao perfil de aprendizagem.
Oferecer um “cardápio de atividades” para o aluno escolher uma para elaborar e enviar como tarefa, com opções de diferentes formatos: texto, vídeo, mapa metal, infográfico, narrativa, slides ou música. Por exemplo:

  • Crie e envie uma história;
  • Apresente os principais conceitos do curso e a conexão entre eles e a vida de cada um de nós por meio de mapa mental, eslaides ou infográfico; ou
  • Elabore um plano de ação para resolver um problema concreto relacionado ao tema.

Figura 3

Fonte: Faria, J. B. (2021)

Figura 3: Tipos de atividades baseadas em metodologias ativas que podem ser aplicadas em cursos a distância autoinstrucionais.

Desafios

Como mencionado, as sugestões de atividades propostas acima são um conjunto de possibilidades que podem ser aplicadas a muitas ações educacionais a distância, inclusive as que são realizadas sem tutoria. O desafio maior para cursos sem tutoria é o receio de que os aprendizes não realizariam tarefas que não valessem pontos, ou seja, sem contribuição para as notas, e, no caso, encontrar formas de como superar a utilização exclusiva de questionários na EaD e avaliar o produto de atividades não objetivas.

Nesse sentido, é necessário considerar a cultura organizacional e o público-alvo do curso, bem como ter clareza de que existem vários perfis diferentes de aprendizagem e, para potencializar o engajamento e a aprendizagem significativa, é importante propor atividades de diferentes formatos e níveis de aprofundamento.

Considerações finais

As atividades propostas nos resultados da pesquisa são apenas algumas das possibilidades existentes. Muitas outras podem ser criadas, conforme lista descritiva das principais metodologias ativas utilizadas (Tabela 1). O essencial é que elas mantenham os princípios básicos para a aplicação de metodologias ativas na educação, citados por Filatro e Cavalcanti (2018): protagonismo do aluno, produção colaborativa de conhecimentos, e ação-reflexão.

Inovações metodológicas são necessárias para atender ao perfil de alunos da era digital (o mundo mudou, os alunos também). Moran (2018) defende também que aprendemos o que nos interessa e que a aprendizagem ativa mais relevante é a relacionada à própria vida. Nesse sentido, ressaltam-se aspectos do desenho instrucional de ações educacionais que podem contribuir para o engajamento e a aprendizagem significativa: proporcionar a perspectiva formativa dos cursos a distância para os diferentes perfis de alunos, com diversificados interesses e necessidades de aprofundamento sobre o tema, considerando importante também a experiência de aprendizagem do aluno, que pode ser mais interessante se agregarmos elementos lúdicos e, principalmente, possibilidades de escolher se aprofundar em partes do conteúdo que tiverem mais sentido para cada um, no formato que cada um se expressar melhor.


Além de possibilitar engajamento e aprendizagem significativa, bem como formas de conectividade e de criação de redes de conhecimento que a era da informação proporciona, as metodologias ativas têm potencial de promover a aplicação do conhecimento na vida real.


Referências Bibliográficas

  • BATES, A. W. T. Educar na era digital: design, ensino e aprendizagem. São Paulo: ABED, 2017.
  • FARIA, J.B. Metodologias ativas em educação a distância: possibilidades de aplicação para promover engajamento dos alunos e aprendizagem significativa. Brasília: ENAP, 2021. Disponível em https://repositorio.enap.gov.br/handle/1/92?offset=0.
  • FILATRO, A. Design instrucional contextualizado: educação e tecnologia. São Paulo: SENAC, 2004.
  • FILATRO, A.; CAVALCANTI, A. C. Metodologias inovativas em educação presencial, a distância e corporativa. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
  • MATTAR, J. Metodologias ativas para educação presencial, blended e a distância. São Paulo: Artesanato Educacional, 2017.
  • MORAN, J. Metodologias ativas para uma aprendizagem mais profunda. In:
    BACICH, L.; MORAN, J. Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018. Parte 1, p. 1-25.
Ficha Técnica

Texto baseado no Trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Inovação e Tecnologias na Educação, apresentado à Escola Nacional de Administração Pública – ENAP em 2021 por Juliana Bernardes de Faria, com orientação da Profa. Dra. Carolina Costa Cavalcanti e disponível em: https://repositorio.enap.gov.br/handle/1/92?offset=0.

Responsável pelo projeto:
Seção de Soluções em EaD e Desenho Instrucional
Centro de Formação e Gestão Judiciária
SEADI/CEFOR/STJ

Texto:
Juliana Bernardes de Faria, servidora da Seção de Soluções em EaD e Desenho Instrucional - SEADI/CEFOR/STJ, Psicóloga, Mestre em Psicologia pela Universidade de Brasília - UNB e Especialista em Inovação e Tecnologias Educacionais pela Escola Nacional de Administração Pública – ENAP.

Joel de Castro Mota, servidor da SEADI/CEFOR/STJ, Pedagogo pela UnB e Especialista em Gestão Estratégica em Educação a Distância pelo Centro Universitário SENAC.

Revisão:
Raquel Oliveira Nunes, servidora da SEADI/CEFOR/STJ, conteudista, mentora e palestrante de cursos institucionais, Life Coach, Analista comportamental e especialista em Neurociência e Comportamento.

Desenho gráfico:
Mário Aguirra Fiorese, formado em Desenho Industrial pela UnB e servidor da SEADI/CEFOR/STJ.

Imagens:
stockphoto.com; unsplash.com